Brasil traça quatro estratégias para contornar as sobretaxas de Trump

Entre as alternativas estão apelo à OMC e até elevação de tarifas sobre produtos americanos

Patrícia Campos Mello

Folha de São Paulo, 9.mar.2018 às 2h00

O governo e indústrias do Brasil estudam pelo menos quatro reações às sobretaxas ao aço e ao alumínio anunciadas pelo presidente Donald Trump nesta quinta-feira (8). As tarifas, que variam de acordo com o tipo de produto, passarão de até 0,9% para 25% sobre o aço e de 2% para 10% sobre o alumínio.

Uma opção é recorrer à OMC (Organização Mundial do Comércio), argumentando que as importações de aço e alumínio não representam ameaça à segurança nacional dos Estados Unidos.

Cogita-se também pedir que indústrias americanas consumidoras de aço brasileiro contestem a medida no Departamento de Comércio americano.

Outras possibilidades são retaliar por meio de elevação tarifas sobre produtos americanos importados pelo Brasil, dentro das margens permitidas pela OMC, ou promover uma negociação estratégica entre governos.

A justificativa do governo Trump para impor as sobretaxas é a suposta necessidade de preservação da segurança nacional, prevista na seção 232 da Lei de Expansão do Comércio de 1962. As tarifas seriam necessárias para evitar o “potencial impacto de mais fechamentos de fábricas sobre a capacidade necessária em uma emergência nacional”, como diz Trump na proclamação.

Com isso, a elevação de tarifas seria permitida por se tratar de exceção prevista no artigo 21 do Gatt (Acordo Geral sobre Tarifas e Comércio): proteção para interesses essenciais de segurança, suprimento de forças armadas e alta de sobretaxas em período de guerra ou emergência.

O governo brasileiro vê a justificativa de Trump como “protecionismo disfarçado de segurança”. Argumenta que as importações não ameaçam a segurança nacional, portanto a justificativa não é válida para impor as tarifas.

Assim, seria possível pedir à OMC a abertura de um painel, que, em última instância, poderia determinar que as tarifas são ilegais e estabelecer a compensação ou retaliação com base no valor das exportações perdidas.

Há duas questões: os painéis mais recentes do tipo na OMC levaram de três a quatro anos. E, como o governo Trump nutre profundo desprezo pelo organismo —até bloqueou a nomeação de juízes do Órgão de Apelação—, poderia ignorar as decisões.

A segunda opção, contemplada pelo Instituto Aço Brasil, é pedir a indústrias americanas consumidoras de aço brasileiro que contestem a medida no governo. De acordo com a proclamação, as indústrias nos EUA podem pedir revisão das tarifas caso aço e alumínio “não estejam disponíveis em quantidade razoável ou qualidade satisfatória”.

Com essa reclamação formal, a isenção do Brasil passaria a ser analisada.

Para Marco Polo de Mello Lopes, presidente-executivo do Instituto Aço Brasil, a OMC é uma alternativa que tem de ser pensada após se esgotarem as negociações.

A terceira possibilidade é seguir a linha dos europeus, que já anunciaram possível retaliação. A alternativa, porém, é vista com cautela, porque poderia ajudar a desencadear uma guerra comercial.

Na interpretação da União Europeia, as tarifas impostas por Trump não têm nada a ver com segurança nacional e são, na realidade, salvaguardas para conter suposto aumento inesperado das importações.

motocicleta e jeans

Por isso, seguindo o acordo que trata de salvaguardas na OMC, os europeus precisariam receber uma compensação pelas perdas comerciais causadas —se não receberem, estarão autorizados a retaliar proporcionalmente, após 90 dias. A Europa apresentou uma lista de cem produtos que podem ser alvo de retaliação, como motos Harley-Davidson, e jeans.

O Brasil poderia fazer algo semelhante, elevando as tarifas que atualmente impõe sobre produtos americanos para o máximo permitido pela OMC (consolidado) e suspendendo outras concessões. Pode também retaliar em temas de interesse dos americanos, como patentes.

Por último, pode-se promover uma negociação estratégica, argumentando que Brasil e EUA têm uma cooperação essencial em segurança, o que permitiria a isenção. “Qualquer país com o qual tenhamos uma relação de segurança pode discutir com os EUA maneiras alternativas”, diz a proclamação.

CONTRA-ATAQUE

O que o Brasil pode fazer

1 – OMC

Recorrer à Organização Mundial do Comércio, sob o argumento de que as importações não representam ameaça real à segurança nacional e que a justificativa não é válida

2 – PARCERIA

Pedir que indústrias americanas consumidoras de aço brasileiro contestem a medida no Departamento de Comércio dos EUA

3 – RETALIAÇÃO

Retaliar via elevação de tarifas sobre produtos americanos importados, dentro das margens da OMC

4 – NEGOCIAÇÃO

Promover uma negociação estratégica entre governos, argumentando que Brasil e EUA têm uma cooperação essencial em segurança

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