Petrobras está em recuperação, mas crise não acabou, dizem especialistas

Empresa registrou lucro de quase R$ 7 bilhões no 1º trimestre, o maior desde 2013; melhor gestão, alta do preço do petróleo e corte de investimentos contribuíram.


Por Daniel Silveira, G1 Rio

09/05/2018 06h00  Atualizado há menos de 1 minuto

O presidente da Petrobras, Pedro Parente, tinha muito a comemorar nesta terça-feira (8), quando divulgou o melhor lucro trimestral da empresa desde 2013. Mas foi com cautela que ele fez o anúncio, lembrando que a companhia está saindo de uma de suas piores crises desde que viu seus negócios abalados pela Operação Lava Jato. Para analistas do setor, o tom de Parente está correto: o balanço financeiro sinaliza a recuperação da petroleira, mas não representa fim da crise na Petrobras.

Estamos cautelosos, mas felizes com os resultados que estamos trazendo a público”, declarou Parente durante a coletiva de imprensa na qual detalhou olucro líquido da Petrobras de R$ 6,961 bilhões no primeiro trimestre de 2018.

Parente afirmou que o resultado “consolida a trajetória de recuperação” da Petrobras, mas enfatizou que o trabalho ainda não está concluído. “Não podemos relaxar. E de maneira nenhuma nós vamos relaxar porque ainda temos um endividamento muito elevado”, ponderou.

Recuperação em curso

O bom desempenho da Petrobras é um reflexo de um plano de reestruturação da empresa que está em curso desde 2016. Naquele ano, a Petrobras revisou seus projetos para tentar sair da crise que assolou a empresa, parte consequência de desvios de recursos em escândalos de corrupção, mas também pela queda no preço do barril de petróleo nos últimos anos e pela própria crise econômica nacional.

Em comunicado à imprensa, Parente afirmou que a companhia está “cumprindo à risca o que prometemos no nosso plano de negócios anunciado em 2016″. Entre as principais medidas do plano, estão:

  • Redução de 25% nos investimentos, para US$ 74,1 bilhões em 5 anos;
  • Meta de levantar US$ 21 bilhões em vendas de ativos no biênio de 2017 a 2018;
  • Redução da participação da empresa na produção de fertilizantes e no setor petroquímico;
  • Redução da alavancagem financeira (termômetro de endividamento medido pela relação de dívida líquida/Ebitda).

“O resultado espelha o esforço que está sendo empenhado em toda a empresa. Aqui estamos vendo resultados em todas as áreas. E isso consolida a recuperação da Petrobras. Há redução da dívida, de custos, de alavancagem, o que gera uma base sólida para a empresa”, destacou o presidente da companhia.

Dívida ainda é alta

Para o sócio-diretor do Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE), Adriano Pires, a cautela de Parente é justificável.

Este resultado consolida uma trajetória de recuperação, não uma recuperação. Não pode achar que com esse resultado está resolvido o problema da companhia”, avaliou o analista.

Segundo Pires, nenhuma outra petroleira tem uma dívida líquida tão alta quanto a Petrobras – a soma chegou a US$ 81,4 bilhões no primeiro trimestre deste ano. Ele concorda, no entanto, que a gestão atual está trabalhando para sanar o problema.

O Ivan Monteiro [diretor financeiro da companhia] conseguiu alongá-la e reduzir os juros”, ponderou.

Preço de mercado para combustíveis

Em Rio Branco, o litro da gasolina varia de R$ 4,48 a R$ 4,75. Alguns postos chegam a oferecer desconto no pagamento em dinheiro (Foto: Reprodução/Rede Amazônica Acre)

Ainda segundo Adriano Pires, quatro pilares da gestão de Pedro Parente, queassumiu o comando da Petrobras em maio de 2016, são responsáveis pela recuperação da empresa:

  1. nova política de preços de diesel e gasolina, que prevê a mudança do valor dos combustíveis na refinaria diariamente, de acordo com preços de mercado;
  2. plano de desinvestimentos, que prevê a venda de negócios não essenciais para reduzir o endividamento da companhia;
  3. redução de custos, que torna a operação mais eficiente;
  4. investimentos seletivos, feitos em áreas estratégicas para a empresa, especialmente no negócio de exploração e produção de óleo e gás.

Este resultado refletiu o trabalho feito por toda a diretoria da companhia, que voltou a reposicionar a Petrobras como empresa, não mais como manobra política”, enfatizou Pires.

Para o ex-diretor da Agência Nacional de Petróleo, Gás e Biocombustíveis (ANP) e professor do Grupo de Economia da Energia da UFRJ, Helder Queiroz, a Petrobras acertou, sobretudo, na nova política de preços dos combustíveis.

Ainda que não seja muito transparente, [a nova política] obedece a flutuação do preço do petróleo bruto no mercado internacional e a Petrobras deixa de reajustar seus preços apenas para controle inflacionário”, afirmou Queiroz.

Petróleo em alta

No primeiro trimestre, a alta do preço do petróleo impactou positivamente no resultado financeiro da Petrobras, destacaram os dois analistas. “Não basta ser competente, tem que ter sorte também”, apontou Pires. “Todas as empresas se beneficiam desse momento de alta do petróleo”, lembrou Queiroz.

Além do petróleo, a alta do dólar pressiona os valores cobrados pela Petrobras. A moeda americana atingiu R$ 3,57 nesta terça-feira, maior valor em cerca de dois anos.

Os preços maiores da commodity chegaram nas bombas do consumidor final. Agasolina, que encerrou 2017 com valor médio de R$ 4,09, custava R$ 4,225 na semana passada, de acordo com levantamento da ANP.

O presidente da estatal refutou diversas vezes que a empresa seja responsável pela alta de preços do combustível no Brasil. Desde março, passou a divulgar o valor praticado nas refinarias, que é menor do que nas bombas – o preço ao consumidor também inclui impostos e a margem das distribuidoras.

Mas os dados da própria empresa mostram que os preços estão subindo também nas refinarias. A valor do litro de diesel saltou de R$ 1,8565, em 23 de março (primeiro dado disponível), para R$ 2,1289 nesta terça-feira, alta de 14,7%. Já a gasolina subiu de R$ 1,6404 para R$ 1,8404 no mesmo período, variação de 12,2%.

Valor de mercado

A trajetória de recuperação da empresa se reflete em sua avaliação no mercado. A companhia vale cerca de R$ 311 bilhões, de acordo com dados da consultoria financeira Economatica com base nas cotações da estatal na segunda-feira (7).

É uma valorização de 40% no ano, mas um valor ainda aquém aos R$ 510,3 bilhões que ela valia na sua máxima histórica, em 21 de maio de 2008, nos tempos áureos da estatal e da economia brasileira.

Lava Jato ainda sem fim

Além de danos à imagem, a operação Lava Jato trouxe perdas financeiras para a Petrobras. Em 2015, a companhia estimou que perdeu R$ 6,2 bilhões com esquemas de lavagem de dinheiro e desvio de recursos.

Mas o prejuízo foi além. A companhia foi processada por investidores estrangeiros que se sentiram prejudicados pelo esquema de corrupção. Em um acordo para encerrar o processo firmado em janeiro deste ano, a estatal concordou em pagar US$ 2,95 bilhões. Esse valor levou a empresa a registrar prejuízo em 2017, pelo quarto ano seguido.

Na divulgação do último balanço financeiro, Parente evitou citar a Lava Jato. Questionado se ela ficou para trás, se limitou a dizer que “a empresa hoje é uma empresa muito melhor preparada”. Apesar da melhora financeira, a Petrobras ainda ligada à operação que segue desvendando esquemas de corrupção na estatal.

Horas antes da divulgação do novo balanço financeiro, policiais saíam às ruas de três estados para cumprir mandados de prisão em nova fase das investigações da Lava Jato, que apura propina de R$ 200 milhões paga ao MDB, PT e ex-funcionários da Petrobras por meio de fraude em contrato e contas no exterior entre 2010 e 2018.

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