Com desaforos de Trump, relação entre EUA e União Europeia azeda de vez

Irã, aço, clima: presidente vem empilhando decisões que contrariam interesses europeus

18.mai.2018 às 2h30

Folha de São Paulo, Patrícia Campos Mello

“Olhando para as últimas decisões do presidente Donald Trump, podemos pensar: com amigos como esse, quem precisa de inimigos?”, disse, nesta quarta-feira (16), o presidente da União Europeia, Donald Tusk.

Está difícil discordar de Tusk. 

A relação entre europeus e americanos azedou de vez. Nos últimos meses, Trump adotou uma série de medidas que contrariam frontalmente os interesses da União Europeia. 

Apesar da ofensiva de charme empreendida pelo presidente francês, Emmanuel Macron, Trump anunciou a saída dos Estados Unidos do acordo nuclear com o Irã. Isso é péssima notícia para inúmeras empresas europeias. Com a saída dos EUA do acordo, voltam a vigorar, no período de 90 a 180 dias, as sanções secundárias dos Estados Unidos contra empresas que têm negócios com o setor financeiro, de energia, automobilístico e de aviação civil do Irã. 

As sanções são impostas, na realidade, por meio de instituições financeiras americanas. Um banco americano que continuar fazendo transações com uma empresa europeia na lista das sanções secundárias é punido com multas e outras medidas. Como resultado, elas deixam de fazer negócios com o Irã, por medo de se verem impedidas de acessar o sistema financeiro americano. 

No passado, por exemplo, bancos europeus com subsidiárias nos EUA, como o HSBC, Standard Chartered, ING, Barclays, Credit Suisse BNP e Lloyds, pagaram enormes multas por manterem transações com empresas que continuavam fazendo negócios com o Irã.

A UE estava mais do que empenhada na redescoberta do mercado iraniano e o fim do acordo será uma grande perda. Além do aumento nas exportações para o país (na França, subiram de 562 milhões de euros em 2015 para 1,5 bilhão de euros em 2017), há muitos investimentos em jogo.

A petroleira francesa Total, por exemplo, planejava investir US$ 5 bilhões em um campo de gás iraniano. A Airbus já anunciou que não pretende seguir em frente com o plano de vender US$ 19 bilhões em aeronaves para o Irã.

Sutileza tampouco é o forte do governo americano e seus emissários. Horas antes de assumir seu posto, na semana passada, o novo embaixador americano na Alemanha, Richard Grenell, ameaçou empresas alemãs pelo Twitter. “Empresas americanas que fazem negócios com o Irã devem suspender suas operações imediatamente”, disse o embaixador, pouco diplomático.

O presidente da Comissão Europeia, Jean-Claude Juncker, afirmou que a UE vai ressuscitar o estatuto de bloqueio de 1996, uma legislação concebida para contornar o embargo americano contra Cuba e algumas sanções contra Irã e Líbia.

A legislação prevê penalidades contra empresas europeias que respeitarem as sanções americanas. Ou seja, para as empresas não refresca muito, elas vão ter que optar pelo menor dos prejuízos. Ainda há a possibilidade de elas serem compensadas pelas possíveis punições dos EUA, mas está difícil saber como isso funcionaria na prática. (a lei não chegou a ser usada em sua primeira encarnação).

A única esperança é que os EUA reajam à legislação europeia não sendo tão rígidos na aplicação das sanções secundárias. 

Como se não bastasse esse prejuízo a empresas europeias, Trump também está prestes a impor tarifas de 25% sobre o aço europeu e 10% sobre o alumínio —ou algum misto de tarifas e cotas (na mesma linha do que o Brasil “aceitou” recentemente). Seja qual for a negociação até 1 de junho, data limite para decisão (se não for adiada, como Trump costuma fazer), boa coisa não será —algum tipo de restrição nas exportações será imposta.   

Ah, isso tudo sem falar na saída dos EUA do acordo do Clima de Paris, no ano passado. E na abertura da embaixada americana em Jerusalém. E na saída da Parceria Transpacífico.

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