Por Jessica Bahia Melo

Investing.com – Se este ano foi de dificuldades em série para algumas das empresas do setor de carnes brasileiras, 2022 parece mais promissor. A retomada das importações de carne bovina pela China, de bovina e suína pela Rússia e a continuidade da demanda elevada dessas commodities a nível global são fatores animadores para os principais players do setor, que atuam tanto no Brasil quanto nos mercados globais. No entanto, o boicote de redes europeias a marcas brasileiras devido ao desmatamento no país é um dos destaques negativos, caso persista.

Quatro empresas de companhia aberta do setor frigorífico estão listadas na bolsa de valores brasileira, a B3 (SA:B3SA3), e tiveram performances bem distintas este ano, assim como os preços das carnes. Os futuros do boi gordo apresentaram forte valorização em 2021. Há um ano, estavam cotados a U$112, enquanto nesta quarta-feira (22) passam de U$135. Situação diferente foi a do porco magro, que teve alta expressiva no meio do ano, a U$122 e agora cai para próximo de U$82.

Tendo isso em vista, enquanto companhias como Marfrig (SA:MRFG3) e JBS (SA:JBSS3) – cujo mercado consumidor está principalmente nos Estados Unidos – viram um ano de margens elevadas a um nível que não é considerado sustentável por analistas consultados pelo Investing.com, a Minerva Foods (SA:BEEF3) sofreu com as restrições à China e a BRF (SA:BRFS3) com a queda na renda e desemprego no Brasil, pois esta última possui um foco maior no mercado interno do que os outros frigoríficos citados.

O mesmo aconteceu com os desempenhos das ações. Nesta quarta-feira (22), a BRF recuou em 2021, com uma pequena desvalorização de 0,94%. O preço máximo foi de R$31,98, mas agora os papéis estão cotados em torno de R$22. Minerva contou com variação anual de 11,06%, atingindo máxima em R$10,91 – pouco acima dos R$10,37 no momento da escrita. Já os papéis da Marfrig acumularam um avanço de 60,19%, tocando a máxima de 26,56, mas agora no patamar de R$21,82. Do setor, a maior alta acumulada é da JBS, que teve valorização anual de 71,7%, com máxima de R$38,95, também próximo dos R$37,18 atuais.

O embargo e o retorno

A China derrubou na semana passada o embargo à carne bovina brasileira. As restrições começaram após ocorrências, em setembro, de casos de vaca louca nos estados de Minas Gerais e Mato Grosso. As exportações brasileiras de carne bovina haviam registrado quedas consecutivas nos últimos meses com a decisão da maior compradora do produto de suspender os embarques. Hyberville Neto, consultor de mercado da Scot Consultoria, acredita que a liberação está relacionada à necessidade de carnes que a China possui devido ao ano novo chinês, comemorado em fevereiro.

Antes mesmo da liberação por parte da China, em novembro, a Rússia anunciou tarifa zero de importação de carne bovina e suína e cotas para importação de diversos países, incluindo o Brasil. A expectativa é que no primeiro trimestre de 2022 o governo russo realize inspeções para habilitação à exportação de novas plantas brasileiras.

O que pode afetar 2022 no cenário global
Em relatório sobre as perspectivas globais para o setor de carnes, o Bank of America (BofA) destacou que as companhias puderam sustentar as margens devido à forte demanda nos Estados Unidos e México. Para 2022, o BofA não espera que os custos de commodities tenham queda significativa, trazendo uma pressão de custos e limitando expansões de margens. A retirada de estímulos monetários nos Estados Unidos também pode afetar o mercado, mas a expectativa é de que o rendimento continue acima de níveis históricos. Para o ciclo de gado brasileiro, a tendência apontada pelo banco é de redução da retenção de gado, aumentando a disponibilidade e reduzindo custos. Para o frango, preços menores de grãos tendem a beneficiar o setor, assim como a inflação – com os custos mais elevados, há migração para essa carne, que é mais barata do que a bovina.

No nível doméstico, a expectativa é de que a melhora do clima beneficie safras de milho e soja, reduzindo a pressão de custos. Hyberville Neto acredita mesmo que a China tenha retomado parte da produção de suínos, ainda há espaço para ampliar os embarques brasileiros – e também para as outras proteínas. “As expectativas para a produção de carne no ano que vem não são fortes na China, eles recuperaram a produção dos suínos nos últimos dois anos, mas para 2022 a expectativa é de queda na produção”, detalha. O consultor concorda que a tendência é de aumento na oferta de gado no país, com menor retenção de fêmeas no rebanho. “Esperamos aumento da oferta, mas não de forma abundante, que poderia derrubar o mercado”, completa.

Marfrig
A Marfrig, que atua principalmente no mercado de carne bovina nos Estados Unidos, com unidades fabris instaladas no país norte-americano, teve um ano beneficiado pela injeção de recursos do governo dos EUA na economia, apresentando margens acima da média histórica – situação que tende a se normalizar, segundo os analistas consultados. Registou, no terceiro trimestre de 2021, um EBITDA ajustado de R$4,7 bilhões, um crescimento de 115,6% na comparação anual e lucro líquido de R$1,7 bilhão, 148,7% superior.

A XP (NASDAQ:XP) (SA:XPBR31) possui recomendação de compra para a ação, com preço-alvo de R$34,80. Leonardo Alencar, analista de agro, bebidas e alimentos da XP Investimentos, acredita que o cenário de oferta e demanda em boas condições nos EUA favorecem a empresa. “Com essa injeção de capital do mercado americano, teve recordes nos preços das carnes”, lembra.

Itaú BBA classifica Marfrig como Outperform, com preço-alvo de R$ 26. Gustavo Troyano, analista de alimentos e bebidas do Itaú BBA, concorda que o ano foi atipicamente positivo e a tendência é de resultados também acima da média no ano que vem, mas com margens não tão elevadas. “Uma margem média do setor fica em torno de 4% a 7%, esse ano tem empresas com margens acima de 20%, o que é muito forte”, detalha. A expectativa, no entanto, é que fiquem ainda acima de dois dígitos.

JBS
Mais diversificada em proteínas e em mercado de atuação, a companhia registrou EBITDA ajustado de R$13,9 bi no 3T2021 (+74,2% ao ano). O lucro líquido de R$7,6 bi representa um crescimento de 142,1% na comparação com o mesmo trimestre do ano passado. Também conta com grande exposição aos Estados Unidos, mas exporta para Europa, Austrália, entre outros países. Atua com carne bovina, suínos e agora entra até em pescados. “Isso pode dar uma sensação de mais segurança, os Estados Unidos passavam uma confiança de recuperação mais forte. Agora, com a inflação pesando mais lá, já começa a ficar mais incerto, o que pode tirar a atratividade desses papéis”, destaca Fabiano Vaz, analista da Nord Research.

No entanto, a JBS está entre as top picks do setor de carnes do BofA, que acredita que, mesmo com ar margens menores no mercado norte-americano, novas aquisições devem incrementar os próximos resultados. O preço-alvo é R$70.

BRF
Também com potfólio diversificado de produtos, a BRF é uma das maiores empresas globais de alimentos, dona de marcas como Sadia, Perdigão e Qualy. A companhia possui foco maior em processamento e está mais exposta à economia brasileira, apesar de atuar também com exportações para diversos países, entre eles os do Oriente Médio. A empresa vem sendo afetada pela alta nos preços dos grãos, necessários para a produção de aves e suínos, o que afeta as margens. A BRF registrou um prejuízo líquido de R$271 milhões no terceiro trimestre de 2021, contra um lucro líquido de R$ 219 milhões no mesmo período do ano passado. No entanto, houve aumento da receita líquida em 24,6% na comparação com o 3T20, chegando a R$ 12,3 bilhões. 

OPA e incorporação pela Marfrig

Na semana passada, a BRF informou ao mercado, por meio de Fato Relevante, que vai realizar um aumento de capital por meio de emissão de 325 milhões de novas ações em uma Oferta Pública de Ações (OPA). A estimativa é que a BRF levante aproximadamente R$ 6,6 bilhões com a operação, o que permitiria expandir suas atividades e a realização de investimentos estratégicos, além de melhorar a estrutura de dívida, diminuir o custo total e reduzir a alavancagem. A medida vai ser votada na Assembleia Geral de acionistas no dia 17 de janeiro.

Analistas brasileiros veem a operação como uma oportunidade para a Marfrig assumir o controle da BRF. Atualmente, a Marfrig detém 33,2% das ações da BRF e, segundo o estatuto da BRF, o acionista que atingir o controle de 33,3% das ações terá que lançar uma oferta pública para a compra de todas as ações restantes com um prêmio de 40% sobre o preço médio dos papéis dos 30 ou 120 dias anteriores, o que for mais alto. Isso poderia corresponder a um preço 65% acima do valor de mercado da BRF.

No entanto, em caso de um aumento de capital, a regra do estatuto que limita o controle acionário da BRF deixa de ser válida. Apesar de ter um histórico agressivo de aquisições, analistas não têm visão clara de como o avanço da Marfrig na BRF aconteceria. Essa é uma história que nos reserva em 2022.

Minerva
A Minerva é uma das líderes na América do Sul na produção e comercialização de carne in natura e derivados, mas também atua na exportação de gado vivo. A empresa apresentou no terceiro trimestre deste ano um crescimento anual de 24% no Lucro Líquido, atingindo R$72,4 milhões. O EBITDA do 3T21 foi recorde, atingindo R$648,1milhões, um aumento de 17% se comparado ao 3T20.

Segundo o analista do Itaú (SA:ITUB4), a companhia é a mais beneficiada com a liberação do governo chinês, pois é a empresa com maior market share naquele mercado.

A Nord Research possui recomendação de compra para a ação, mas não dispõe de um preço-alvo. “A Marfrig é uma ótima empresa e tem exposição superinteressante nos Estados Unidos, mas lá é um mercado mais competitivo, com custos maiores. A Minerva tem a vantagem da exposição à China, um mercado novo, que ainda está crescendo. A classe média dos últimos anos aumentou a renda e as pessoas melhoram a alimentação. A Minerva está aproveitando isso e é um mercado gigantesco ainda”, compara Fabiano Vaz.

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