Efeitos da tragédia de Brumadinho, somados à crise na Argentina e à falta de coordenação política do governo, reduziram confiança do empresariado e do consumidor; alguns economistas já falam em ‘cheiro de recessão’
Luciana Dyniewicz, O Estado de S. Paulo
13 de maio de 2019
A crise na Argentina, o corte na produção industrial mineral decorrente da tragédia de Brumadinho (MG) e um governo sem coordenação política, reduzindo a confiança do empresariado e do consumidor, têm levado especialistas a preverem mais um ano perdido na economia – o terceiro depois da recessão em que o Produto Interno Bruto (PIB) não deve crescer muito mais que 1%.
Apesar de a impressão geral dos economistas ser de uma economia estagnada em um patamar muito baixo, há quem já fale em “cheiro de recessão”, como a economista-chefe da XP Investimentos, Zeina Latif, ou em “possível recessão técnica”, como o economista-chefe da MB Associados, Sérgio Vale.
Para Zeina, os sinais mais preocupantes vêm da indústria, cuja produção recuou 2,2% no primeiro trimestre deste ano. “A indústria geralmente é o abre-alas da crise. Em 2011, já dava sinais da recessão que estava por vir (em 2015 e 2016). Se ela estiver estagnada mesmo, vai puxar o setor de serviços, que é muito dependente dela”, diz a economista, que não descarta a possibilidade de o PIB de 2019 ser inferior ao 1,1% registrado em 2018.
O setor industrial, sobretudo o segmento automotivo, tem tido impactos negativos da crise na Argentina, que reduziu as importações totais do Brasil em 46,5% no acumulado dos quatro primeiros meses do ano. O segmento da mineração é outro que tem sofrido e acumula queda de 7,5% no ano até março.
Zeina destaca que há também uma substituição de produtos industriais nacionais por importados, apesar de o dólar ter subido. “Isso mostra que há algum problema estrutural grave, de competitividade”, diz.
A crise, porém, já começa a ir além da indústria. Na última semana, dados do IBGE apontaram que o varejo está desacelerando. De fevereiro para março, o setor cresceu apenas 0,3% e decepcionou analistas. “O consumidor está novamente preocupado com a possibilidade de perder o emprego, o que trava o consumo”, diz Vale, da Tendências.
O economista afirma que estagnação é o melhor modo de definir a atual situação econômica brasileira. Ele lembra, no entanto, que pode haver uma recessão técnica (dois trimestres consecutivos de queda no PIB) no País se o crescimento do quarto trimestre do ano passado for revisto para baixo.
Entre outubro e dezembro, o PIB avançou 0,1%, mas é comum que o IBGE reveja os dados para apresentar uma radiografia mais precisa da realidade. Para o primeiro trimestre deste ano, bancos como Itaú e Bradesco já projetam retração do PIB.
Segundo Vale, o elemento que agrava a situação é a instabilidade política, com o próprio governo gerando constantemente novas crises e reduzindo as expectativas do investidor.
A tensão dos agentes econômicos tem aparecido nos indicadores de confiança do Ibre/FGV. O de incerteza econômica atingiu 117 pontos em abril, o mais alto desde as eleições.
Ex-presidente do Banco Central, Affonso Celso Pastore diz que a economia anda de lado e que é preciso criar confiança – através de reformas – para que ela volte a crescer. “O momento é muito ruim. O desempenho, desanimador. A economia está parada em um ponto bem baixo e sem expectativa de crescer.” Segundo ele, a probabilidade de o País repetir o PIB tímido dos últimos dois anos é alta, o que resultaria num aumento do PIB per capita de apenas 0,3%.